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17 de agosto de 2014

Anda, vamos dançar!

"Convite",  Agosto 2014
Fernanda Azougado


Sopro em sussurro...não se movem. Estico, estico o braço o mais que posso...não consigo.
Só uma. Uma que se movesse, me envolvesse em uma dança ao som de um imaginário piano, rodopiássemos no céu azul, diluídas num sonho infinito...

7 de julho de 2014

À procura

Tempo
Autor: Fernanda Azougado



Meia dúzia de pessoas saem do comboio. Em silêncio. A estação renovada. Não olha pormenores. Sobe a avenida como se não tivesse destino. Vai andando. No Rossio, o silêncio já não é silêncio. Circulam automóveis e um som vindo dos céus, fá-la olhar o azul, único. Alto, muito alto, um monomotor rasga o sossego do céu.
Sente-se insegura, talvez não deveria estar aqui. Continua no seu passo, decidida.
Na praça central, senta-se numa das esplanadas. Sem pressa. Há paz. E silêncios cortados. E o sol a banhar-lhe o rosto.
Assusta-se quando o empregado lhe perturba os pensamentos. “ Um café, se faz favor.”
Não repara no jovem, sentado na mesa em diagonal á sua, supostamente alheio aos sons e silêncios.
Muitos minutos depois, levanta-se. Sobe a rua em direcção à Sé entre turistas e gente da terra. Entra e sai numa e noutra loja de artesanato, sem interesse, como se vagueasse num sonho.
Entra na catedral deserta. Memórias atropelam-se, quebrando a paz.
Na rua, um vento quente e seco abraça-a de mansinho.
Contempla o templo, sem tempo nem horas.
Em pequenos passos, chega ao jardim. Senta-se num banco, ao sol quente. Juras de amor eterno, beijos roubados, sonhos perdidos no tempo. Há tanto tempo!
Regressa á praça, lentamente, a esticar os minutos. Entra num táxi. “Boa tarde. Por favor, para Lisboa, aeroporto.”
No dia seguinte, uma foto multiplica-se em partilhas on-line.
“ Jovem atento, capta princesa em visita secreta às origens”.

2 de julho de 2014

Ontem, Hoje, Amanhã...Sophia

O Mar de Sophia














..." E de novo caminho para o mar.
     Sinto que hoje novamente embarco
     Para as grandes aventuras,
     Passam no ar palavras obscuras
     E o meu desejo canta---por isso marco
     Nos meus sentidos a imagem desta hora."...

Sophia de Mello Breyner Andresen, "Hora" em "Dia do Mar", 1947

23 de junho de 2014

Retalhos de um sonho

Estação Santa Apolónia-Lisboa
Autor: Marco Almeida
(...) Tem trinta minutos. Há quem tenha acabado de chegar. Rostos cansados, o desejo da chegada aonde quer que seja. Olhares entre sorrisos, na esperança da descoberta numa cidade desconhecida.
Francisca imagina este mesmo átrio, nos tempos em que viajar de avião era para poucos e como o comboio unia países distantes.
A mais antiga estação da cidade foi construída no local onde existiu o convento de Santa Apolónia, tendo sido adquirido em 1852 pela Companhia Real dos Caminhos de Ferro. Inaugurada a 1 de Maio de 1865, com um só andar, ponto de partida para destinos nacionais e internacionais.(...)
F.A.

(Excerto de uma história sem nome)

31 de maio de 2014

A janela de Garcia de Resende

Janela manuelina da Casa de Garcia de Resende - Évora
Fotografia de Fernanda Azougado
"Janela antiga sobre a rua plana...
Ilumina-se o luar com o seu clarão...
Dantes, a descansar de luta insana
Fui, talvez, flor no poético balcão...

Dantes! Da minha glória altiva e ufana,
Talvez...Quem sabe?...Tonto de ilusão,
Meu rude coração de alentejana
Me palpitasse ao luar nesse balcão...

Mística dona, e em outras primaveras,
Em refulgentes horas de outras eras,
Vi passar o cortejo ao sol doirado...

Bandeiras! Pagens! O pendão real
E na tua mão, vermelha, triunfal,
Minha divisa: um coração chagado!...

Florbela Espanca
Charneca em Flor, 1931

27 de maio de 2014

Caminho

"Um caminho" - Fernanda Azougado

"Mas entre mim e os meus passos há um intervalo também: então invento os meus passos e o meu próprio caminho. E com palavras de vento e de pedra, invento o vento e as pedras, caminho um caminho de palavras".
António Ramos Rosa, "Sobre o Rosto da Terra"

5 de maio de 2014

de.sa.bro.char






...salpicos de sons, espreguiçar de cores ténues, num clic, o adormecer dos candeeiros guardiões da noite. E, aos poucos, a esperança nos sons e nas cores a fervilhar em instantes de um outro ínicio...

29 de abril de 2014

Regresso

A luz dos faróis projecta-se na porta, ao centro do prédio branco, chamando a atenção a barra amarela à volta das janelas.
Sobe o olhar, o número sete é reconfortante. Antes de entrar, aspira o odor de lenha queimada, adivinhando gente ao redor da lareira nas casas vizinhas. Cães ladram ao longe, salpicando o silêncio da noite.
No hall, o cheiro de plantas regadas. Abre a porta sem pressa. Pétalas de rosas secas fazem esquecer o silêncio da casa. Um pequeno corredor à direita e, outro que termina na divisão desejada.
Sem estilo definido, móveis com história de família, convivem com estantes repletas de livros que aconchegam. Do exterior da janela, adivinha-se a relva aparada. A cama, convida ao sonho desperto.
A enorme cama de tubo preto, lembrando ferro, enche o olhar da divisão. Ladeada de mesinhas de cabeceira com tampo de mármore, espelho, pés altos e compartimento onde, na geração anterior se colocava o bacio de porcelana, contam quase um século na família, assim como a cómoda castanha que juntas, há muito aguardam restauração a rigor. Na parede, sobre a cómoda, um espelho emoldurado, aproveitamento do roupeiro dos avós maternos que não resistiu ao passar dos anos.
Aos pés da cama, estantes com o mesmo tom, repletas de livros, uns ordenados alfabeticamente ou por temas, outros ao acaso.
A escrivaninha junto à janela, ocupa grande parte da única parede que dá para o exterior, onde o sol permanece até se esconder.
No canto oposto, a mesinha de chá, pertença da avó Alice, onde convivem fotografias de pessoas em momentos felizes.

F.A. Outubro 2009